(Re)pensar o território para proteger o futuro
A ciência prevê que os fenómenos climáticos extremos se tornem mais frequentes e severos no futuro. E as consequências serão sobretudo sentidas pelo ser humano, com perdas materiais e financeiras significativas e impactos negativos sobre a saúde. Proteger a população está ao alcance dos municípios.
Portugal é um jardim à beira-mar plantado, mas o que significa isso em termos climáticos? Significa viver num país com um clima “mediterrâneo com feição mais atlântica no litoral e mais continental no interior”, e onde a ocorrência de fenómenos climáticos extremos é uma das suas características, explica Maria José Roxo, geógrafa e investigadora na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (NOVA FCSH).
Se é verdade que a existência destes eventos em Portugal não é nova, há algo que está a mudar: “Vamos ter, no futuro, maior frequência e intensidade destes fenómenos extremos”, o que “resulta das alterações climáticas”, explica Filipe Duarte Santos, Presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS).
Portanto, “temos de fazer um planeamento urbano que mitigue e minimize efeitos adversos”, acrescenta o especialista. Mas ainda antes de se aplicarem medidas de adaptação às alterações climáticas é preciso conhecer a fundo o território, incluindo as suas diferentes características e vulnerabilidades.
Um país, diferentes desafios
Se Portugal é pequeno em dimensão, isso não quer dizer que sinta os efeitos da mudança climática de forma homogénea. Como explica Maria José Roxo, “uma medida que é muito boa para mitigar ou adaptar no Norte pode ser um profundo erro no Sul. O ordenamento do território e a adaptação à mudança climática implicam conhecer o território nas suas componentes física e humana”, para se estudarem soluções específicas.
É justamente esse trabalho que o Green Deal Going Local Handbook está a tentar fazer, orientando decisores regionais e locais na implementação do Pacto Ecológico Europeu. De acordo com este guia do Comité das Regiões Europeu, Portugal divide-se em três áreas climáticas onde se enfrentarão – e onde já se enfrentam – grandes desafios.
Comecemos pela região mediterrânica. Aqui, espera-se que as temperaturas excedam a média europeia e que as on- das de calor e as secas se tornem mais habituais e prolongadas, de acordo com o guia. Estão assim reunidas as condições para a escassez de água e consequente competição pelos recursos hídricos, bem como para a propagação de incêndios florestais. O aumento das temperaturas também leva à disseminação de espécies de fauna e flora invasoras que ameaçam a biodiversidade existente.
Para um território feito de regiões diferentes, é preciso medidas adequadas a cada realidade
Consequências que, no fundo, serão sempre sentidas por quem as causou: o ser humano. Não só as temperaturas excessivamente altas irão afetar sobretudo as “pessoas de idade” ou “com problemas cardiovasculares”, concorda Filipe Duarte Santos, como vão contribuir para a propagação de vetores transmissores de doenças.
Já nas zonas costeiras, as preocupações principais serão sobretudo centradas na subida do nível médio global do mar. Esta subida é provocada pelo “aumento da temperatura média da atmosfera” e pelo derreter da massa de gelo dos glaciares, explica Filipe Duarte Santos. Esta situação pode levar a inundações costeiras e ao aumento da temperatura das camadas superficiais do oceano.
E se as camadas superficiais do oceano ficam mais quentes, o que acontece? Alterações na sua acidez que ameaçam a biodiversidade marinha. Assim, as espécies irão tendencialmente migrar para norte em busca de melhores condições de vida.
Além da zona costeira, a região atlântica também terá de gerir o aumento do nível global do mar e o risco de inundações costeiras. E como se isso não bastasse, as inundações provocadas por episódios de chuva intensa também podem aumentar. A par da precipitação, o alerta do Comité das Regiões Europeu estende-se às tempestades de inverno, face ao risco de danos nas infraestruturas dos edifícios.